segunda-feira, 29 de outubro de 2007


Nas férias do diabo.

Já se passaram séculos de discórdia e disputas e parece que fim não vai chegar. A pendenga do diabo, sua revolta contra o Todo Poderoso, o orgulho continua afetando o animal cego que não quer ver. Como ele o “coisa ruim” existem muitos e porque não dizer, a maioria dos humanos padece desse mal.
Já era caso conhecido de toda a vizinhança e também já vazara pelas veredas do subúrbio os muitos casos e “causos” de Celso de Ogun, pai de santo da antiga e de reconhecidos feitos. Era ele certamente respeitado e muito temido se querem saber. Nada de importante acontecia sem que Pai Celso não fosse consultado. Era o bicho nos búzios, dizia-se que acertava até loteria e também curava de unha encravada até sei lá o quê. Seu terreiro era freqüentado até pelo povo rico que vinha de longe. Tinham dias que a fila de carros de luxo virava a esquina.
Celsinho pros íntimos, nos dias de folga, adorava um saroel furtacor, roupinhas folgadas, coisas bem despojadas e descontraídas. Não sai de casa sem o séqüito de cambonas, puxa sacos e seus amasiados da vez. Sua casa era ponto certo de artistas em suas famosas feijoadas, políticos eram seus afilhados e faziam romaria em época de campanha.
Num vacilo seu ou de seus santos, a casa ao lado à sua, separada somente por uma bucólica cerca-viva, foi alugada por um tal de Cleber, moreno boa pinta, sua cara de índio impressionou o macumbeiro de tal forma, a ponto de Celsinho acender uma carreira de velas na sexta-feira seguinte abrindo todos os caminhos do futuro vizinho. Ficou tão apaixonado que chegou a pedir umas férias pro cramunhão para poder se dedicar ao que seria certamente seu novo e amor!! Agora vivia fazendo planos e já se cercara de todo o tipo de mandinga, ria com histeria dizendo: na minha gira ninguém pia essa peça já é aqui da titia!!! O forasteiro só aparecia de terno, um luxo, assim dizia Celsinho cego de alegria. Todo dia pela manhã, namorava a casa ao lado e sonhava com a chegada da mudança e seu elegante príncipe.
Ninguém sabia nada sobre o estranho, o que fazia e nem ao menos de onde era ou vinha.
Em uma noite de sexta-feira o coro da curimba roncava em polvorosa, com os atabaques, berimbaus e surdos em algazarra preconizavam o Demo. Os pontos eram cantados tão alto que lá da praça, a distância se podia escutar. Aquela noite era do Seu Sete Encruzilhadas, a entidade mais forte e violenta que baixava no terreiro. Lá pelas tantas da noite o trabalho seguia forte, Celso já tinha mamado umas quatro garrafas de cana, quando resolveu acender uma pemba das grandes lá fora. Saiu roncando, cantando e rodando feliz da vida com seu exu incorporado...dizia hoje vou adivinhar tudo, gritava: quem quer saber o quê caboclo? Vai, pede que eu vou dizer! De repente, sem esperar ou entender se tornou subitamente quase lúcido se contorcendo olhou pra traz e agora babava e roncava fino vendo um vulto, não escutava mais o som da curimba, deparando surpreso com o povo todo vendo! se viu recebendo sua sentença de morte ...Tá amarrado demônio em nome de Jesus, manda fogo do céu Senhor !!! que Jesus te repreenda demônio, aniquila este mal Senhor !!! Celso rodou e caiu, a vista turva via a luz incômoda que o enfraquecia...torceu os olhos e viu um vulto de terno e agora sacudindo uma Bíblia apontava e dizia sai demônio mentiroso!!!! Pregando determinado estava o novo vizinho .....que enfim chegara. Celso mais uma vez virou os olhos, babou desprotegido e em voz fraca... roncou com raiva ...Ô crente felá da ..... me pegou!! nas férias do diabo!!!!
e assim sumiu ele e a pemba !!! não levou nem o saroel.

21/04/2007.
Ruy Eduardo de Castro.

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